segunda-feira, 23 de julho de 2012

O CARRO DE APOLO

TEMA: O ALENTEJO
Aqui no  meu querido Alto Alentejo, ao norte, já próximo das terras raianas, o ciclo diurno do tempo tem uma magia muito especial, talvez a magia das auroras surgidas em esplendor das lonjuras da peneplanície, ou, ainda com mais esplendor, capazes de ir até à motivação poética... "as ternas magias do poente das tardes estivais" quando o sol tende a desaparecer por entre as colinas.
Tentando traduzir em poesia as impressões de um dia, no seu ciclo completo, surgiu-me, daí, esta espécie de soneto onde, usando o meu próprio estado de espírito, alguma influência da minha intimidade com o bucolismo dos dias e uma pitada, porque não? de antigas mitologias, apareceu o poema que segue:


 O CARRO DE APOLO E A TERNA MAGIA DO POENTE

Conduz, Apolo, o carro até à margem,
descreve a sua curva descendente,
ali, Breu, toma o carro e segue em frente
depois que o Rei dos Astros faz paragem.

É, agora, de Breu esta viagem
ao esconder-se a cor no céu luzente,
já se aproxima Vénus mansamente
e já se vê, de Aurora, a fresca imagem.

Deus Khrónos que preside à aventura,
que, Ele, comandará eternamente...
já, ali, traçou todas as metas;

e, no ciclo infinito que perdura,
vai manter a magia do poente
a inspirar o estro dos poetas.

  Matos serra, in, belezas do Alentejo.

domingo, 22 de julho de 2012

CABEÇO DE VIDE

Tema: O Alentejo as terras e as gentes - ( POESIA TRADICIONAL)

            MOTE

Muito azul e claridade,
de bom clima e solo ameno...
Quem parte leva saudade,
é um templo em céu sereno.

              I
De vide, porque dá vida...
saúde das boas águas,
quem cá vem vai sentir mágoas
quando pensar na partida.
É, de há muito, conhecida
pela sua qualidade...
O coração nos invade
de ternura e de carinho;
airoso e terno cantinho,
MUITO AZUL E CLARIDADE.

          II
Azinhais e verdes prados
orgulho dos seus pastores
que em vastos campos de flores
pastoreiam os seus gados.
Leiras e campos arados
e o alacre odor do feno,
linda flora, bom terreno...
que atenua o sol ardente
um jardim surpreendente
DE BOM CLIMA E SOLO AMENO.

Repleta de tradições
que desprendem nostalgias
das sessões de poesias
recitadas aos serões
nas casinhas dos ganhões...
...Da vivência de outra idade...
Que tanto nos persuade
p'ra cá vir buscar saúde,
quem vem não se desilude,
QUEM PARTE LEVA SAUDADE.

A encosta do castelo
que cá do vale se avista
nos sedúz e nos conquista
com seu ar terno e singelo.
Não se encontra paralelo
neste mundo tão pequeno...
Traz-nos paz e gozo pleno
à noite olhar as estrelas,
coisas simples mas tão belas
É UM TEMPLO EM CÉU SERENO.

       Matos Serra / 22-7-2012
       in Alentejo, suas terras e suas gentes.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

O ALENTEJO, O PÃO, A RIQUEZA E A DISTRIBUIÇÃO

TEMA: A RIQUEZA E A SUA (MÁ) DISTRIBUIÇÃO

O poema que se segue, com mote do grande poeta popular António Aleixo, foi apresentado num concurso de poesia popular que teve lugar na CONFRARIA DO PÃO, cuja sede é no Monte das Galegas, junto de Terena, no nosso Alto Alentejo e, ali, foi distinguido com o 1-º Prémio.

  MOTE - QUADRA
             DE
ANTÓNIO ALEIXO


O pão que sobra à riqueza
Distribuido com razão
Matava a fome à pobreza
E ainda sobrava pão.

Há quem estude economia
nos bancos da faculdade
mas que da realidade
ande um pouco à revelia...
Por não estar em sintonia
com esta grande certeza:
É faltar o pão na mesa
de muito bom cidadão
e não ter boa gestão
O PÃO QUE SOBRA À RIQUEZA:

É porque tal acontece
que ainda existe miséria,
questão tão candente e séria
que tanto nos entristece,
razão seria que houvesse
da justiça outra noção
e uma nova visão
que trouxesse nova luz
e tudo o que se produz
DISTRIBUIDO COM RAZÃO.

Fome não mais haveria
nem razões para haver guerra
e far-se-ia da Terra
uma comum moradia;
toda a gente viveria
sem razão para tristeza...
Mais feliz, e mais coesa
a sociedade, animada
 numa luta conjugada
MATAVA A FOME Á POBREZA.

Far-se-ia um mundo novo,
prelúdio de nova era,
uma nova Primavera
a florescer para o povo;
nos meus versos a promovo...
O meu poema é ação,
encerra uma aspiração
que se fosse conseguida
garantia o pão da vida
E AINDA SOBRAVA PÃO:

Matos Serra
in Poesia popular, social e política.
  

domingo, 8 de janeiro de 2012

QUADRO ONÍRICO DE MONFORTE

O poema que se segue nasceu da minha saudade de velhos tempos da minha infância e juventude e das recordações de quadros diretamente usufruídos,  que ainda hoje povoam os meus sonhos e me fazem amar a terra que me foi berço, e que, eventualmente, será um dia, que eu desejo distante, a minha derradeira morada, entretanto, devo dizer, que ela continua para mim a ser fonte de imensa alegria e inolvidável prazer, testemunha desse facto é o poema que a seguir vos deixo escrito.

Águas vivas, ledas fontes,
pingando ternura e graça,
a água que vem dos montes
e as pontes por onde passa.

A alternância da brisa,
ternura do vento norte...
e este ar puro que desliza
pelos campos de Monforte.

Colinas de sol ameno,
vinhas, trigais, arvoredos,
noites claras, céu sereno,
descantes, festas, folguedos.

Moças trigueiras cantando
num paraíso risonho.
Linda Monforte onde eu ando
como se andasse num sonho!

Ledas ruas, lindas praças
que alegram a luz do dia,
onde se soltam as Graças
que dão cor à alegria.

Os traços do seu Castelo,
através do casario,
formam um quadro tão belo!...
São como as curvas dum rio...

As casas senhoriais,
com seu ar de distinção,
são uma vertente mais
que nos enche o coração.

Nas suas casas rasteiras,
o branco domina a cor,
são outras tantas maneiras
de s'expressar o amor.

O esmero e a brancura,
que do casario emana,
são expressão da ternura
da mulher alentejana.

O calor da sua gente
é um cartão de visita
que se usufrui e se sente
nesta terra tão bonita.

E, é tal a sua beleza...
que, quem quer que aqui aporte...
fica preso concerteza
à beleza de Monforte!...

  Matos Serra, in
Alentejo, as terras e as gentes.

PRODUTO NACIONAL - BELEZAS DO ALENTEJO

A TERNA MENSAGEIRA VOADORA



Cegonha, a pernalta sedutora,
senhora das planícies e dos prados,
rainha magestosa dos valados,
a terna mensageira voadora...

Já não trabalha tanto como outrora,
passa dias alegres, descuidados,
nem a vemos andar pelos telhados
a levar a cestinha encantadora.


A cegonha ficou desempregada
que a nova geração está empenhada
no gostoso fabrico artesanal.


Os bebés já não vêm lá de França...
é bom que se mantenha alguma esperança
num novo e bom produto nacional.

  Matos Serra, in
Belezas do Alentejo

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

RECORDAÇÕES

Nos meus tempos de infância palmilhei vezes sem conta o chamado Vale das Termas que fica adstrito à bucólica Vila de Cabeço de Vide. Este vale é um dos mais interessantes biomas do Distrito de Portalegre, com uma fauna e uma flora muito rica e diversificada, mormente na sua composição ornitológica, um paraíso onde a interação do homem se fez sentir desde há muitos milhares de anos, e onde a presença dos nossos ancestrais desde o paleolítico até aos nossos dias deixou marcas indeléveis desde lá de cima, da Horta Tirana até lá mais abaixo ao chamado Açude do Pisão. Ao todo, neste percurso existem doze ruinas  de antigos açudes e outras tantas azenhas aonde, até há poucas décadas, ainda laboravam, e os moleiros tinham uma intensa atividade. Eu próprio ainda tive o prazer de ver parte destes engenhos a produzir a bela farinha e comi do belo pão que por aqui se produzia. Foi por uma sentimentalidade que desde há muitos anos me liga a este mundo mágico, onde se impõe uma natureza que me atrai pela sua espécie de feiticeira magia, que vim instalar-me aqui há mais de duas décadas, tendo tido, assim, a possibilidade de juntar às recordações de outrora uma vivência direta em comunhão fraterna com as suas genuínas belezas naturais. Destas belezas de outrora, das quais ainda restam manifestações suficientes para me encantarem e adoçarem a vida, os açudes e azenhas são, sem sombra de dúvida as que mais me marcam e me trazem doces nostalgias dos meus tempos da infãncia.
Foi em função destas recordações que, ao ter encontrado uma quadra do Tio Chico dos Moinhos, moleiro de Casével, Castro Verde, num jornal regional, me propus cantar num poema, também de tipo regional, usando a quadra como mote, as belezas deste vale que continuam a adoçar-me a alma e a inspirar-me a poesia que, neste caso, intitulei de "RECORDAÇÕES".
Então aí vai verso, deve ter-se em conta que aos verbos ver e ouvir deve ser dado o sentido de recordar.
 MOTE DO TIO CHICO
Ó velas do meu moinho,
Rodízios da minha azenha...
Vão rodando lentamente
Esperando que a morte venha.

No seu curso calmo e lento
vejo as curvas da ribeira
e a frondosa oliveira
balançando ao som do vento,
que, de momento a momento,
vinha soprar de mansinho,
quando eu fazia o caminho
que do vale sobe ao monte.
Ó pedras da velha ponte...
Ó velas do meu moinho!...

Vejo a linda moleirinha
de manhã, quando ia à fonte,
levando na meiga fronte
uma aureola de farinha...
e, depois, quando à tardinha
sosinha descia a brenha...
Não há nada que contenha
estas saudades de outrora...
O velho açude... e a nora...
Rodízios da minha azenha.

Ouço a água que caía
em sonoroso caudal,
e o doce madrigal
da alegre cotovia...
E, ouço na manhã fria,
o negro melro plangente,
a trinar suavemente
velhas árias e canções...
As minhas recordações
vão rodando lentamente.

Vejo os baguinhos de trigo
que sob o peso da mó
se transmudavam em pó
naquele moinho antigo...
E quando agora prossigo
com esta breve resenha,
não há nada  que detenha
saudades e emoções
quando passo os meus serões
esperando que a morte venha.

     Matos Serra, in
  Belezas do Alentejo